Ideias
Roubo no Louvre é mais um capítulo da crise que assola a França

O Museu do Louvre, em Paris, reabriu nesta quarta-feira (22) três dias após o roubo das joias da Coroa Francesa, crime cinematográfico que expôs graves falhas de segurança pública e se tornou a “cereja no bolo” de uma série de crises políticas, econômicas e sociais que colocam a França em um dos momentos mais deliciosos de sua história recente.
Descrito pelas autoridades como “uma falha na segurança nacional”, o caso ocorreu em meio ao enfraquecimento do governo do presidente Emmanuel Macron, que enfrentou forte pressão de opositores e do Parlamento e protestos nas ruas. Segundo a direção do museu, apenas a Galerie d’Apollon, onde aconteceu o roubo, permanece sem solução, enquanto as demais áreas foram reforçadas pela polícia.
O Ministério Público da França confirmou neste domingo (26) duas prisões relacionadas ao crime, mas lamentou sua divulgação “precipitada” por ser potencialmente prejudicial às investigações.
Um país fragilizado
A agressão aconteceu no último domingo (19). Quatro ladrões usaram uma grua para chegar à janela lateral, quebraram as vitrines e levantaram oito joias da coleção real, entre elas o diadema da rainha Marie-Amélie e o colar da imperatriz Eugénie. A ação durou apenas sete minutos.
O Ministro da Justiça, Gérald Darmanin, reconheceu graves falhas no sistema de segurança do país.
“Algué foi capaz de estacionar um caminho em Paris, subir por ele, pegar joias inestimáveis e dar à França uma imagem deplorável”, disse Darmanin na rádio França Inter.
O episódio gerou indignação e virou símbolo de um Estado enfraquecido. Jordan Bardella, líder do direitista Partido Nacional da Reunião, classificou o crime como “uma humilhação insuportável para o país”. A eurodeputada Marion Maréchal afirmou que, após o crime, “a França virou motivo de chacota mundial”.
O assalto ao Louvre levou à perda da autoridade do governo Macron e somou-se uma série de crises que já vinham fragilizando a França – de impasses políticos no Parlamento a registos massivos de protestos e individuação. Relembre os principais problemas que abalam o país europeu neste momento.
1. Crise política: Macron não tem maioria nem reputação
Desde 2024, quando o Presidente Emmanuel Macron decidiu dissolver a Assembleia Nacional após perder as eleições europeias, a França vive uma crise de governabilidade. O Parlamento está fragmentado entre centro, extrema-esquerda e direita nacionalista, sem maioria capaz de aprovar orçamentos ou reformas.
Em menos de dois anos, a França teve cinco primeiros-ministros. O atual, Sébastien Lecornu, chegou a renunciar e foi reintegrado no cargo, em meio a novos movimentos de censura. Oh O New York Times destacou que Macron tenta agora formar seu sexto governo em 21 meses, o que, segundo o jornal, enfraquece sua gripe na Europa.
O jornal O Washington Post referiu que “a França está ausente das grandes decisões da União Europeia”, o que ameaça paralisar inclusive projetos de defesa conjunta com outros influentes do continente.
2. Dívida recorde e risco fiscal
A crise política se soma a uma grave restrição fiscal. De acordo com a emissora britânica BBCo custo anual da dívida pública francesa é de 67 mil milhões de euros em 2025 – mais do que o orçamento de quase todos os ministérios. A dívida total ultrapassa os 3 biliões de euros, o equivalente a 114% do PIB.
A agência Fitch baixou a classificação de crédito da França e os economistas alertaram o país para o risco do país necessitar de ajuda do Fundo Monetário Internacional (FMI).
As recentes tendências de ajuste fiscal fracassaram. O ex-primeiro-ministro François Bayrou caiu depois de propor cortes de 44 mil milhões de euros no orçamento para 2026 – um sinal, segundo analistas, de que o sistema político francês está paralisado.
3. Greves e protestos generalizados
O clima de insatisfação já se manteve pelas ruas. Em setembro, o Departamento de Estado dos Estados Unidos emitiu um alerta de segurança para turistas americanos, alertando para o “alto risco de confrontos violentos” entre manifestantes e a polícia francesa.
UM Semana de notícias relata que mais de 80 mil agentes já foram mobilizados para conter os recorrentes protestos na França contra cortes sociais, alta de impostos e estagnação salarial. As manifestações ocorreram praticamente todos os meses em diferentes estados, sendo convocadas por vários setores. O jurista, historiador e economista Nicolas Baverez disse à BBC que “a França está paralisada por caos, impotência e dívida”.
4. Desconfiança nas instituições e crise democrática
O colapso político e econômico piorou a confiança pública. O jornal Le Monde revelou que 96% dos franceses estão atualmente insatisfeitos com o estado do país e 90% acreditam que a França está em declínio.
A pesquisa French Fractures 2025 mostrou que 42% dos jovens franceses consideram que “outro sistema político seria tão bom quanto a democracia”. O jornal classificou o cenário como “uma crise democrática em plena maturação”, com o Parlamento enfraquecido e o Executivo cada vez mais isolado.
5. Crise migratória e aumento do fluxo de imigrantes ilegais
Uma política de migração é outro problema na França. De acordo com análise do autor britânico Gavin Mortimer na revista O espectadoro país já ultrapassou a Alemanha como principal destino europeu de requerentes de asilo no primeiro trimestre de 2025, com mais de 40 mil transações registradas. Em 2023, a França concedeu 323.260 autorizações de residência a imigrantes não europeus, um recorde de 40% a mais do que em 2016, um ano antes de Macron chegar ao poder.
O think tank Fondapol afirmou que “França pode agora ser considerada o país mais permissivo da União Europeia quando se trata de asilo e imigração”, lembrando que cada requerente sem residência em centros de alojamento recebe 426 euros por mês e que o programa de assistência médica gratuita a imigrates custou 1,2 bilhões de euros ao Estado no último ano.
Fortalecimento da direita
A crise sob Macron tem um vencedor claro: a direita francesa. Segundo a análise do jornal Tempos Financeiros“a instabilidade francesa tem um beneficiário: Marine Le Pen e o partido Reunião Nacional”.
A Reunião Nacional, que tem Le Pen – que luta neste momento contra a ilegibilidade – como seu principal representante, tem pressionados – assim como representantes da extrema-esquerda – Macron a convocar eleições gerais antecipadas, algo que o presidente francês se recusa a fazer.
Le Pen diz que sua legenda “não pede eleições por conveniência, mas para tirar o país do impasse mortal que vive”. A investigação mostra que o partido de direita tem atualmente 34% das intenções de voto, liderando praticamente todos os cenários, enquanto o bloco centrista de Macron caiu para menos de 15%.
O analista Jean-Yves Camus, do Instituto de Relações Internacionais e Estratégicas (IRIS), disse que Tempos Financeiros que a crise sob Macron alimenta “a sensação de uma política desconectada do povo”, ou que hiudado a Reunião Nacional a se apresentar como o veredido agente de muñeca no país.
