Música
Seu Jorge sobre atuar em ‘A Melhor Mãe do Mundo’: ‘Não queria que vissem o cantor’
A Melhor Mãe do Mundo, novo longa de Anna Muylaert (Que Horas Ela Volta?), chegou ao streaming nesta quarta-feira, dia 5 de novembro, trazendo Seu Jorge (Marighella) na figura de Leandro, um marido abusivo para com sua esposa Gal, vivida por Shirley Cruz (O Clube das Mulheres de Negócios).
Em conversa com a Rolling Stone Brasil, o cantor e ator compartilhou os bastidores das filmagens, como foi fazer parte de um projeto tão feminino e o esforço para não deixar sua fama interferir no personagem. Confira a seguir:
O que te atraiu a participar de A Melhor Mãe do Mundo?
Seu Jorge: Oportunidade, né? Mais um filme, mas esse era especial: só de mulheres, só mulheres no comando de uma produção cinematográfica. Isso a gente tem que celebrar. Estar ali, como único homem no meio de tanta gente talentosa, com tanta capacidade de contar essa história… Ser escolhido por elas, ser um consenso entre elas, foi um privilégio e uma honra.
E como foi o processo de leitura e interpretação do roteiro?
Seu Jorge: Foi um espaço de aprendizado, de desconstrução. Um lugar de empatia, de olhar a vida sob o prisma da dor de uma mãe, de uma chefe de família. A personagem [da Shirley Cruz] tem uma profissão essencial para a cidadania, mas que é invisibilizada. A gente teve liberdade na mesa, para trocar impressões. A escuta delas foi muito generosa.
Você aparece no filme de forma discreta a princípio — só a voz, a silhueta — e, depois, surge em um momento impactante. Como foi gravar essa entrada?
Seu Jorge: Tudo estava muito bem organizado pela Ana [Muylaert, diretora] e pela Lílis [Soares, diretora de fotografia]. Era uma área externa, com muita movimentação: crianças, grupo de pagode, churrasquinho. Tinha uma coreografia no set. Foi uma escolha bem pensada pela direção. Entrei na cena com tudo muito claro, as posições de câmera, as marcações. Isso facilitou demais. Eu só precisei me adaptar à estrutura que elas já tinham desenhado. Elas ensaiaram tudo antes, então ficou fácil entrar no clima, mesmo sendo uma cena com dois moods diferentes, a festa em si e o fim da festa.
Você interpreta um personagem que é difícil, até desagradável. Como foi construir esse papel?
Seu Jorge: Um cara que nunca fiz antes. Difícil. Desagradável mesmo. Mas necessário. Espero que o público entenda a importância de olhar essas histórias do cotidiano urbano. Tentei construir um personagem distante de mim, de forma honesta.
Como você lida com o fato de ser reconhecido como cantor em tela?
Seu Jorge: Olha, essa é uma luta. Sempre que o personagem não é músico, e ainda assim precisa cantar, o risco é a plateia ver o Seu Jorge ali, não o personagem. Tento evitar isso ao máximo. Foi assim na série Manhãs de Setembro, quando o diretor queria que eu cantasse Milton Nascimento. Toquei de forma errada, propositalmente, para mostrar que aquele cara não era um músico exímio.
Esse conflito entre cantor e personagem já te causou algum mal-entendido?
Seu Jorge: Já. Quando fiz versões das músicas do David Bowie para o filme A Vida Marinha com Steve Zissou, levei a sério essa coisa de não parecer o Seu Jorge. Criei letras novas, tirei a afinação perfeita, toquei de um jeito mais simples. Só que lançaram o disco antes do filme sair. Muita gente não entendeu. Teve até crítica dizendo que o disco era “uma merda”. Fiquei arrasado, me afastei do projeto.
‘Não queria que vissem o cantor’, revela Seu Jorge sobre personagem em ‘A Melhor Mãe do Mundo’ (Divulgação/+Galeria)
Mas o disco virou um sucesso…
Seu Jorge: Sim, ironicamente. O próprio Bowie, depois, escreveu que nunca tinha imaginado que suas músicas tinham tamanha beleza — só após ouvir minhas versões. Mas quando ele faleceu, três dias depois meu pai também faleceu. Minha ex-mulher, Mariana, me disse: “Faz esse tributo para eles.” Aí fiz dez shows. Viraram 17. Depois 32. Virou turnê mundial. Tudo isso nasceu da tentativa de esconder o cantor e mostrar o personagem.
Então, para finalizar, o canto do Leandro não é o canto do Seu Jorge?
Seu Jorge: Exato. Eu tentei ao máximo descaracterizar o Leandro do Seu Jorge. É muito difícil entrar em cena e cantar sem parecer comigo mesmo. Por isso, tentei disfarçar o máximo possível.
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