Celebridade
Médica alerta para colapso após desabafo de Vera Fischer: ‘Pode ser muito perigoso’

O desabafo da atriz Vera Fischer sobre a escassez de convites para atuar após os 70 anos evidenciou uma ferida aberta no mercado artístico e na sociedade brasileira: o etarismo. Mas, para além da questão trabalhista, o “cancelamento” pela idade carrega riscos profundos à saúde psíquica.
Para entender os impactos reais desse estigma, a CARAS Brasil conversou com a médica especialista em Longevidade Consciente e Saúde Mental, Dra. Roberta França. Segundo a especialista, o fenômeno descrito por Vera não fere apenas o ego, mas ataca a vontade de viver.
O risco do quarto dos fundos
Para a Dra. Roberta, retirar o protagonismo de quem envelhece é um convite ao adoecimento. Ela explica como a falta de validação externa corrói a autoimagem:
“A falta de oportunidade, a falta de visibilidade, ela interfere muito no nosso propósito. Quando nós somos cada vez colocados no aposento dos fundos, quanto mais nós deixamos de ser olhados como pessoas que podem contribuir, que podem ajudar, que podem fazer, que são capacitadas, isso vai minando a sua energia, vai minando a sua autoestima, vai diminuindo o seu desejo real de fazer as coisas, e sim, muitas vezes você leva essa pessoa à perda de propósito de vida.”
A especialista alerta que esse processo leva a questionamentos perigosos sobre a própria existência. Quando a sociedade diz “não precisamos mais de você“, o idoso internaliza essa mensagem de forma devastadora:
“Se eu não sirvo pra mais nada, o que eu estou fazendo ainda aqui? Se eu não tenho mais função, se eu não tenho mais serventia, se eu não posso mais executar nada porque todo mundo acha que eu não sou capaz, qual é a minha função aqui? Então esse lugar ele pode ser muito perigoso. Porque a vida ela pede propósito.”
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A médica reforça que a única saída é a reinvenção, mas reconhece a dificuldade de fazer isso sem apoio:
“A vida pede esse olhar, sempre buscando novos aprendizados, novas habilidades, novos conhecimentos, rede de apoio, novos personagens que precisam entrar na nossa vida todos os dias. Porque a gente sabe que a vida também vai nos trazer perdas, independente da idade. Mas é claro que a idade acaba gerando isso numa proporção maior, e se nesse contexto a gente não consegue refazer a nossa rota, refazer a nossa rede de apoio, criar novos desejos, novas vontades e novos propósitos, a vida perde completamente o brilho, a cor e realmente o desejo real de estar continuando nesse processo todos os dias.”
O abismo entre homens e mulheres
Se envelhecer já é um desafio, para a mulher o peso é dobrado. A Dra. Roberta França é categórica ao afirmar que o envelhecimento feminino é tratado como uma falha, enquanto o masculino é muitas vezes celebrado ou ignorado.
“Não tenha dúvida que o envelhecimento feminino é muito mais penalizado, a mulher sofre muito mais de etarismo, ela sofre muito mais preconceito, ela é muito mais agredida, ela é muito mais cobrada. Obviamente, não é que o homem não sofra etarismo. Mas a probabilidade de um homem perder um emprego, perder uma função por conta da idade, é muito menor.”
A médica destaca a discrepância na cobrança estética, apontando que os sinais do tempo são perdoados no gênero masculino, mas condenados no feminino:
“A própria aparência do homem ela é muito menos cobrada. O homem pode ter o cabelo branco, ter a barba branca, o bigode branco, ele pode ter uma barriga, ele não precisa ter o corpo sarado de academia… e ele não vai ser achincalhado, ele não vai ser cobrado, ele não vai ser agredido e até mesmo humilhado por essa condição. O que raramente vai acontecer com a mulher.”
É um beco sem saída: a mulher é criticada se tenta parecer jovem e criticada se assume a velhice.
“A mulher se ela pinta o cabelo ela é agredida, ela tem o dedo apontado porque ela não está se deixando reconhecer velha. Se ela deixa o cabelo branco ela é confrontada porque ela está velha e ela não deveria deixar o cabelo branco. Se ela deixa o cabelo curto, ela vai sofrer críticas. Se ela deixa o cabelo longo, ela não deveria, porque envelheceu. Então a mulher está sempre nesse lugar da crítica: é a celulite, é o corpo que mudou… a mulher está sempre sendo levada a acreditar que se ela não tiver a beleza dos 20 anos, o visto dos 20 anos, se ela não tiver o seu corpo perfeito, as suas proporções mantidas, se ela tiver ruga, ela vai ser julgada. Tudo ela vai gerar uma penalização, que de um modo geral, a gente não vê com os homens.”
Um convite ao espelho
Diante da repercussão do caso Vera Fischer, qual é a solução? Para a Dra. Roberta, o caminho é o debate contínuo e o reconhecimento da nossa própria humanidade. Criticar o envelhecimento do outro é negar o seu próprio futuro.
“Eu acho que o melhor que a gente pode fazer é o que nós estamos fazendo aqui nesse momento, nessa entrevista: é discutir, é conversar, é trazer essas questões à luz diária, todos os dias. É o que eu busco fazer todos os dias: falar sobre o etarismo, falar sobre essas questões, trazer essa sociedade pra esse debate e principalmente, convidar a sociedade a se olhar no espelho.”
A especialista finaliza com uma reflexão poderosa: o tempo que passa para a celebridade é o mesmo que passa para o anônimo.
“Porque quando eu digo que a Vera Fischer envelheceu e eu conheço a Vera Fischer há 20, 30, 40 ou 50 anos, é porque a mesma idade que passou para ela, passou para mim também. Então qual é o espanto? Qual é o motivo que leva as pessoas a discutirem o envelhecimento ou a criticarem o envelhecimento dela, sendo que todos nós envelhecemos na mesma proporção. Porque os mesmos 10, 15, 20 ou 30 anos que passaram para a Vera Fischer foram os mesmos 10, 20 ou 30 anos que passaram para cada um de nós. Então falar do envelhecimento do outro, criticar o envelhecimento do outro é olhar para nossa própria dor, olhar para o nosso próprio lugar no mundo.”
O apelo final da médica resume o sentimento de muitos que, assim como Vera, apenas querem continuar vivendo plenamente:
“Então é um convite: se olhe no espelho. Olha no espelho e repara que o tempo está passando para todo mundo na mesma proporção. Então essa discussão precisa ser levantada todos os dias, porque todos nós estamos envelhecendo, todos nós vamos envelhecer. E de novo: envelhecer não pode ser punição. E eu sempre termino com uma frase que eu tenho batalhado todos os dias: deixa a gente envelhecer em paz. É um pedido, é um desejo e é realmente uma bandeira que eu busco levantar todos os dias.”
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