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Música

‘Boom bap nunca deixou de existir. É só procurar que ele tá lá’

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Só beat pesado, boom bap me amarro / Levando minha filha pra escola no carro / Reflito, fico pensando como é bom estar viva / Mantendo meu legado, deixando a mente ativa“, rima Kmila CDD em “Jogo Passageiro“, terceira faixa do segundo disco de estúdio da celebrada carreira, intitulado Quebra-Cabeça.

Ao longo das três faixas, guiadas pela intensidade que o boom bap, subgênero do hip hop, pode fornecer, que contam com colaborações de Tasha & Tracie, Cynthia Luz, Iza Sabino e DK47 (além do produtor Daniel Shadow), a artista e irmã de MV Bill canta sobre autoestima, legado, vida periférica e reflexões sobre a vida pessoal e artística. Um prato cheio para todo e qualquer fã de rap.

Lançado nesta sexta, 1º de agosto, Quebra-Cabeça chega ao mundo oito anos após Preta Cabulosa (2017), disco de estreia de Kmila CDD. É um intervalo significativo, mas não significa que a rapper ficou parada durante esse tempo. “Fiz alguns shows, fui mãe (uma das coisas mais importantes da minha vida), teve uma pandemia também que fez com que tudo parasse”, relembrou durante entrevista à Rolling Stone Brasil. “Mas foi no meio dessa pandemia que vi a força da minha voz, do meu trabalho”.

Ver ‘Estilo vagabundo 3‘ pular de 2 para 13 milhões de visualizações, isso no meio da pandemia, foi muito gratificante. Ali eu percebi que minha voz continua ecoando na cabeça e na vida das pessoas.

E o boom bap, hein?

Nos Estados Unidos, a rapper estadunidense Doechii fez sucesso mundial com a mixtape Alligator Bites Never Heal (2024), que possui forte influência do boom bap, que começou a ser debatido e ouvido em grande escala. Vale destacar os nove volumes de “Return of the Boom Bap“, do canal de YouTube Vibin’, que foram lançados entre 2017 e 2024 e somam cerca de 14 milhões de visualizações. Claro, o subgênero criado no final dos anos 1980 na Costa Leste dos EUA não é algo inédito.

Já no Brasil, além da própria Kmila CDD, nomes como Febem, FBC e 2ZDinizz exploraram este estilo sonoro ao longo das respectivas carreiras. “Como eu sou amante do boom bap desde sempre, para mim nunca foi novidade. De repente pode ser uma coisa nova, um espanto, para quem havia se perdido em outra vertente”, explicou a cantora. “O rap tem várias vertentes, e essa do boom bap sempre bateu na minha veia”.

85% das minhas gravações são em cima do beat de boom bap. Boom bap nunca deixou de existir. É só procurar que ele tá lá.

O legado de Kmila CDD

Mais recente capa da revista Capricho, as gêmeas Tasha & Tracie são um dos principais nomes do rap nacional contemporâneo e conquistaram uma legião de fãs em uma curta e bem-sucedida carreira. A dupla participa de “Jogo Passageiro“, na qual as três artistas trazem uma lírica poderosa e intensa com um flow impressionante.

Em certo momento da faixa, Kmila fala sobre estar mantendo seu legado, que impactou dos mais diversos cantores e cantoras do rap. “Isso faz parte do meu legado: deixar versos e músicas marcantes que vão tocar a vida das pessoas”, disse. “Parte desse retorno eu vejo que está sendo feito, pelos resultados que eu tenho colhido pelas ruas”.

Abaixo, leia a entrevista de Kmila CDD com a Rolling Stone Brasil na íntegra:

Como foi o processo criativo deste seu segundo disco de estúdio, Quebra-Cabeça?
Foi um processo um pouco lento, no qual eu não tive pressa. E também não tinha tempo para estar gravando o tempo todo, até porque eu estava sempre em turnê pelo Brasil, acompanhando o Bill. Então foi um processo que pensei devagar, de forma muito criteriosa. Como eu queria fazer uma conexão com alguns artistas mais jovens que se identificam com o meu trabalho, juntar algumas pessoas que eu também tenho identificação (é indicação de via de mão dupla, né?), pelo trabalho que deu eu tive que escolher literalmente os caminhos do disco, como se fossem peças de um verdadeiro quebra-cabeça.

Ele chega justamente cerca de oito anos após o seu primeiro álbum, Preta Cabulosa. Como foi seu trabalho artístico neste meio tempo, que contou com uma pandemia atravessando todo o mundo, e como esse tempo culminou em Quebra-Cabeça?
Eu fiz alguns shows do meu EP Preta Cabulosa, fui mãe (uma das coisas mais importantes da minha vida), teve uma pandemia também que fez com que tudo parasse. Mas foi no meio dessa pandemia que vi a força da minha voz, do meu trabalho. Na música “Estilo Vagabundo”, a voz que faz dueto é a minha. Ver “Estilo vagabundo 3” pular de 2 para 13 milhões de visualizações, isso no meio da pandemia, foi muito gratificante. Ali eu percebi que minha voz continua ecoando na cabeça e na vida das pessoas. Foram grandes acontecimentos nesses oito anos de hiato. Sem falar que a gente não parou de fazer lives, músicas, músicas novas, videoclipes… tamo aí.

Acho que minha faixa favorita do seu disco é “Jogo Passageiro”, com Tasha & Tracie. Como foi colaborar com as gêmeas? Você lembra de como conheceu o trabalho delas?
Eu conheci o trabalho das meninas através da minha filha de nove anos. Ela gosta de ouvir músicas e estava ouvindo um som da Tasha & Tracie, me mostrou e eu curti bastante. Passei a ouvir outras músicas delas. Gostei bastante das meninas, são boas demais. Depois, quando eu as encontrei, ambas vieram falar comigo com muito respeito, dizendo que sou inspiração e referência para elas. E no mundo de tanta vaidade, ter duas meninas que são a cara da periferia, sem medo de reverenciar suas referências, é uma coisa que chama muita atenção. Me sinto feliz por isso. E elas entraram no meu radar pelo comportamento delas. Conheço o som delas, como eu falei, mas a conduta delas comigo foi muito determinante para elas estarem no meu registro, que é uma coisa muito importante para mim.

Além disso, logo na abertura de “Jogo Passageiro” você destaca: “Só beat pesado, boom bap me amarro”. Sinto que nesses últimos anos, seja aqui ou lá fora, o boom bap tem sido bastante explorado. O que você acha disso?
Olha, como eu sou amante do boom bap desde sempre, para mim nunca foi novidade. De repente pode ser uma coisa nova, um espanto, para quem havia se perdido em outra vertente. Porque o rap tem várias vertentes, e essa do boom bap sempre bateu na minha veia. 85% das minhas gravações são em cima do beat de boom bap. Então para mim não é novidade. Boom bap nunca deixou de existir. É só procurar que ele tá lá.

Você também fala sobre estar “mantendo seu legado e deixando a mente ativa”. Para você, uma das rappers mais fundamentais do Brasil, qual é exatamente seu legado? Como você avalia sua trajetória?
Eu acho muito importante deixar músicas para posteridade. Tem músicas que não causam impacto na hora, aquele impacto do hit, que causa um impacto nas pessoas no primeiro momento. E tem músicas que demoram um pouquinho mais para chegar, chegam aos poucos nas pessoas e elas vão assimilando um pouco mais devagar. Mas o bom disso é que tem uma assimilação um pouco mais profunda e isso faz com que o som não saia da mente, não saia do coração, nem tão cedo. Isso faz parte do meu legado: deixar versos e músicas marcantes que vão impactar e tocar a vida das pessoas. Parte desse retorno eu vejo que está sendo feito, pelos resultados que eu tenho colhido pelas ruas.

Você também trabalhou com DK47 e Iza Sabino, que também assina a produção musical ao lado de Daniel Shadow. Como rolou essa troca artística com eles?
Isa Sabino me chamou para participar numa gravação do disco dela. Isa também é admiradora do meu trabalho, super gente boa, simpática pra caramba. Eu vi que ela tinha um grande talento não só para rimar, mas também para compor beats. Eu não perdi tempo, pedi para ela me mandar um kit de batidas. E quando eu escutei uma das faixas, pensei “cara, essa faixa combina muito bem com a ideia que eu tô tendo em mente, vai fechar bonito com outra participação”. Foi justamente a música “Não Vai Se Enganar”, que traz também o verso de DK. 

DK eu já trabalhei junto em outra faixa, no “Favela Vive 4”. Também já fizemos alguns shows com a banda dele. DK é um amigo de longa data e parceiro que abrilhantou muito essa faixa. 

Daniel Shadow produziu alguns discos no passado e cuja sonoridade me agradou muito, gostava muito das produções que ele fazia e por isso ele está no disco.

Ao decorrer de Quebra-Cabeça, você também canta muito sobre autoestima, vida periférica e traz muitas reflexões que você faz. Quais tipos de tema você quis abordar no álbum?
Como eu já sabia que teria alguns feats, eu já fiz pensando em não fechar muito os assuntos para que as participações tivessem liberdade de discorrer sobre os assuntos. Então eu trouxe ali nos meus assuntos a autoestima, a importância da gente estar à frente daquilo que a gente quer, de sermos lutadoras, de corrermos atrás daquilo que a gente almeja. São coisas que parecem muitas vezes clichê, mas que precisamos reafirmar a todo momento, senão a gente perde de vista. Eu acho que a minha contribuição em música, no rap, seria nesse sentido. Fiquei muito feliz com o resultado, porque todos os convidados vieram na mesma vibe que eu. Então ficou uma coisa linda.

Com uma extensa carreira no rap, você se destacou bastante com Pare de Babar e nas músicas “Estilo Vagabundo”, a mais recente “Poetisas no Topo 2” e “O Bonde Não Para”. Como você enxerga a evolução da cultura hip hop ao longo da sua carreira?
Pessoalmente, o hip hop me ajudou muito como pessoa a ter uma visão melhor de mundo, a enxergar situações com olhar mais crítico. A música rap me ajudou a conhecer o Brasil, hoje eu conheço o Brasil inteiro através do rap, então sou muito grata ao que sou, ao que me tornei. Agora, enquanto cultura, cada um está entendendo a cultura hip hop de uma forma diferenciada. Então, o mesmo efeito que teve para mim, eu já não sei se teria para uma criança atualmente, porque mudou muito. Hoje você precisa garimpar bem para achar o verdadeiro hip hop.

Como você pretende explorar esta era de Quebra-Cabeça?
Meu disco está vindo junto com vídeos e eu espero que a galera entre bastante nas plataformas digitais e no YouTube para ver e ouvir. Talvez eu prepare uma apresentação para mostrar essas músicas pessoalmente para o público, e de repente com alguns ou todos os convidados na mesma festa, não sei, estou pensando ainda. É isso. Estou pensando em fazer essa apresentação, mas por enquanto estou aqui “quebrando a cabeça”.

+++LEIA MAIS: Duquesa revisita sonoridade dos anos 2000 com single duplo: ‘Quero algo para ouvir e dançar’

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