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Novo ‘Emmanuelle’ troca erotismo do clássico por exploração rasa da sexualidade feminina

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Quem entrar na sala de cinema esperando reviver a experiência erótica do Emmanuelle de 1974 — com suas tardes de sol, corpos nus emoldurados por um olhar masculino e aquele ar de fetiche burguês disfarçado de liberação sexual — vai se decepcionar. Nas mãos de Audrey Diwan, diretora de O Acontecimento, a nova versão de Emmanuelle não quer seduzir o público, mas sim tentar imbuí-lo com uma exploração da sexualidade feminina que, no final das contas, é completamente rasa.

Sai a fantasia sensual e luminosa dos anos 1970 para dar lugar ao silêncio gelado de um corpo desconectado de si mesmo. O erotismo, que antes era instrumento de libertação ou fantasia, aqui se transforma em sintoma de vazio e alienação. O prazer, que antes cintilava em paisagens exóticas, agora se traduz numa ausência desconfortável nos corredores impessoais de um hotel corporativo em Hong Kong. A Emmanuelle de Diwan não quer ser desejada, ela tenta, de maneira hesitante e quase mecânica, voltar a sentir algo.

Interpretada por Noémie Merlant (Retrato de uma Jovem em Chamas), essa Emmanuelle embarca em uma viagem de negócios em busca de um prazer que parece ter desaparecido completamente do corpo. Não há transformações profundas nem revelações impactantes. O desejo se arrasta em gestos mínimos, toques vacilantes e olhares que não se encontram. A mise-en-scène é fria e asséptica, mas essa precisão estética só reforça a sensação de frieza e distância. O erotismo da diretora é cerebral, quase neutro, preenchido por um silêncio que não sugere mistério, mas apatia. É o que sobra quando o sexo deixa de ser ato de paixão ou entrega para se tornar linguagem falha e desconexa.

Essa abordagem reflete uma ruptura clara com o legado do filme original e a mitologia que ele criou, com suas cenas icônicas de nudez coreografada e corpos femininos moldados para o olhar masculino. Em vez disso, Diwan entrega um olhar que busca ser íntimo, mas acaba se tornando distante e desapaixonado. Não há aqui espetáculo nem provocação. Resta uma mulher perdida tentando reconstruir a ponte entre corpo e desejo, num mundo onde tudo — até o sexo — parece ter sido convertido em produto esvaziado de significado.

Mesmo os encontros íntimos que surgem ao longo do filme são marcados por entorpecimento emocional. A personagem se entrega, mas não se reconhece; a câmera não erotiza essas cenas nem as idealiza, elas apenas evidenciam o quanto o desejo pode ser uma tentativa fracassada de preencher um vazio. O sexo não cumpre sua função narrativa tradicional: não aproxima, não resolve conflitos, não provoca prazer. Serve apenas para ilustrar o colapso das conexões, sejam elas físicas, emocionais ou simbólicas.

A atuação de Merlant, por mais sensível que seja, não consegue salvar este retrato congelado do erotismo. Sua interpretação contida e introspectiva revela não uma musa inspiradora, mas um corpo suspenso, à deriva e desconectado de si mesmo. Sua busca é silenciosa, quase invisível, refletindo um anseio apagado. Quando finalmente chega ao clímax — numa sequência longa e quase ritualística — ele não traz a libertação ou o êxtase esperados. Em vez disso, surge como um lampejo breve e contido, um corpo que tenta se reencontrar, célula por célula — como a própria diretora nos detalhou em entrevista exclusiva —, mas que a câmera mantém à distância, como se respeitasse a privacidade de algo que já não pode ser capturado ou explicado pelo olhar alheio.

Além de fracassar em provocar ou seduzir, Emmanuelle tropeça justamente no que deveria ser seu ponto central: a exploração da sexualidade feminina. Em vez de mergulhar nas complexidades, contradições e nuances do desejo da mulher contemporânea, o filme se limita a uma superfície rasa, quase decorativa, que evita qualquer provocação real. A sexualidade feminina é tratada como um conceito vago, desconectado da vivência, reduzida a gestos mecânicos e olhares dispersos, incapaz de transmitir autenticidade ou poder transformador. Essa visão limitada reforça uma das maiores falhas do filme: a tentativa de traduzir uma experiência profundamente íntima e multifacetada em imagens esteticamente polidas, porém emocionalmente vazias.

Em suma, esse novo Emmanuelle é o retrato melancólico de uma era em que o erotismo perdeu seu poder provocador. Vivemos numa época saturada de imagens hipersexualizadas, corpos expostos e intimidade plastificada e, ainda assim, o desejo tornou-se opaco, difuso e inacessível. Diwan capta essa opacidade com precisão estética, mas entrega um filme que não seduz, transformando o erotismo que havia no clássico em uma versão desprovida de qualquer provocação ou sensualidade verdadeira.

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