Celebridade
‘Vivo um sonho que não sonhei’

Em entrevista à Revista CARAS, Leticia Vieira fala sobre sua estreia no remake de Vale Tudo, os desafios de sua vida pessoal e a perda de seu pai
Ela começou com o pé direito! A estreia de Leticia Vieira (26) em novelas foi logo na pele de Gilda, do remake global de Vale Tudo. Um sonho que ela nunca sonhou, pois nunca imaginou que seria possível. Criada em Belford Roxo, na Baixada Fluminense, ela vem de uma família humilde, já morou na favela da Rocinha e, assim como sua personagem, foi ambulante na praia. Até que a arte a chamou e mudou seu destino para sempre. Em papo exclusivo com CARAS, a modelo e atriz, que conta os dias para a estreia de Vermelho Sangue, série do Globoplay protagonizada por ela, fala das voltas que a vida dá e celebra as oportunidades que vem recebendo.
– Como é fazer uma novela?
– Tem sido um momento incrível na minha vida. Entre erros e acertos, estou aprendendo, me desenvolvendo como atriz. Vivo um sonho que não sonhei. Nunca imaginei estar nesse lugar, nunca imaginei que um dia sairia na rua e as pessoas me reconheceriam.
– Achava que era impossível?
– Venho de uma família simples, de Belford Roxo. Cresci com a cabeça focada em trabalho, em fazer dinheiro e não em estudar, até porque, no local onde cresci, não tinha escola de teatro. Então, ser artista não era uma possibilidade. Na minha família não tinha ninguém que era formado em uma faculdade. Meu pai era açougueiro e minha mãe dona de casa. Ser artista era uma coisa de TV, muito distante, que nunca aconteceria comigo. Cresci pensando que iria trabalhar em caixa de mercado. Acabei trabalhando, com 17 anos, como caixa de loja de roupa, fui vendedora, ambulante, fiz de tudo até chegar à arte. E nem digo que cheguei à arte, a arte que chegou a mim, ela que me achou.
– Como foi esse chamado?
– Trabalhei quase quatro anos em uma marca de roupas e pedi demissão porque estava com a cabeça meio ruim. Até que recebi uma mensagem no Instagram de uma produtora de elenco pedindo para eu fazer um cadastro na Globo. Achei que era brincadeira e não fiz. Dois meses depois, ela me procurou, dizendo que queria me testar para um papel que eles acreditavam ser minha cara. Li o texto e vi que a personagem parecia comigo: uma menina periférica que namorava um motoboy. Na época, eu morava na Rocinha, meu ex era entregador. Fiz o teste, não passei, mas meses depois, outro produtor me chamou para fazer um workshop na Globo. Dali eles escolheriam a protagonista de uma série de fantasia. Fiz e, entre dez meninas, fui escolhida para protagonizar Vermelho Sangue, série do Globoplay. Foi meu primeiro contato com a arte e encontrei um timaço que me ajudou. Enquanto fazia a série, pude me descobrir. Agora, na novela, estou podendo brincar com o pouco que aprendi.
– E pegou gosto pela coisa?
– Peguei! Gosto de atuar. Agora tenho o privilégio de dar voz a uma menina que tem a história parecida com a minha, que vem de periferia, descia o morro para vender sanduíche na praia, conseguiu uma oportunidade por meio de uma pessoa que acreditou nela. Tive muitas Raquéis — Taís Araujo — que me ajudaram.
– Como foi o período na praia?
– Foi uma época difícil, mas de aprendizado. Minha família estava passando por um momento financeiro complicado e eu precisava ajudar. Minha irmã é uma cozinheira de mão-cheia, falei para ela fazer sacolé que eu iria vender na praia. Foram meses duros, de muito trabalho, esforço físico, mental, mas que me trouxeram maturidade.
– Como foi relembrar tudo?
– Quando recebi a proposta para fazer a Gilda, precisei revisitar lugares que achei que já tivesse superado, então recorri à terapia, porque voltar ao passado, em vivências que foram difíceis, algumas até traumáticas, era algo trabalhoso para fazer sozinha. Não tive oportunidade de fazer faculdade, um curso. Estava preocupada em ter cama, edredom, casaco, porque a gente não tinha o básico. Meu pai trabalhava para botar comida na mesa, ele recebia 1300 reais. Precisei ter coragem para sair e fazer o meu. Essa coragem é a maior herança que tenho de tudo que vivi, porque não tenho medo de nada. Penso que, para quem vem do lugar de onde venho, sem nada a perder, o que eu tentar é lucro.
– Você perdeu seu pai antes de a novela estrear. Como encontrou forças para seguir?
– Não encontrei, estou em busca ainda. Meu pai era um cara sonhador, ele via muito a capacidade da gente de realizar nossos sonhos. Meu maior combustível para continuar seguindo com alegria, com esse desejo de vida, vem de olhar para trás e pensar que estou realizando também o sonho dele. Meu pai está em mim, nas coisas que faço, nas lembranças, nas minhas realizações, no que levo para o mundo. Não acho que tenha encontrado 100% de força, estou sarando a cada dia, é um buraco que nunca vou conseguir tapar.
– Mas ele soube da novela?
– Soube. Meu pai foi embora aos 50 anos, tinha muito o que viver ainda. Meu sonho era conseguir um trabalho legal para alugar um apartamento para eles em um lugar bom. Quando passei para a novela, aluguei um apartamento para eles, fiz a mudança e, uma semana depois, meu pai se foi. É quase um ‘nadei e morri na praia’, mas sinto que realizei muitas coisas. Ele não conseguiu me ver na televisão, mas sei que, de onde ele estiver, está muito feliz de ver que estou podendo viver do meu sonho não sonhado.
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