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Assessora com doença grave depende de doações de sangue para viver

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Assessora com doença grave depende de doações de sangue para viver


Caroline Oliveira, 30 anos, assessora de marketing e moradora de Campinas (SP), teve sua vida atravessada desde o início por uma condição genética que ainda é invisível para boa parte da população: a doença falciforme. Ela foi diagnosticada com a doença 40 dias após o nascimento, por meio do teste do pezinho – apesar de o teste ser realizado logo após o parto, os resultados só chegaram algumas semanas depois, momento em que os pais receberam a confirmação clínica do exame.

Ela faz parte de uma geração beneficiada por um avanço importante na saúde pública. “Essa iniciativa foi impulsionada pela Dra. Silvia Brandalise, do Centro Infantil Boldrini. Em março de 1994, ela ajudou a instituir uma lei municipal que viabilizou a triagem neonatal para doença falciforme em Campinas, em colaboração com a Unicamp”, conta Caroline, que nasceu em outubro daquele mesmo ano.

‘O sangue é minha fonte de energia’: assessora convive com doença grave e depende de transfusões para viver
‘O sangue é minha fonte de energia’: assessora convive com doença grave e depende de transfusões para viver – Arquivo pessoal

Transfusão como parte da rotina

Atualmente, Caroline recebe transfusões de sangue a cada 28 dias. Em períodos mais críticos, já lhe recomendaram intervalos menores, como 21 dias. “A transfusão de sangue foi essencial para a minha vida”, afirma a paulista, em entrevista à Catraca Livre, para o especial de Junho Vermelho, campanha em conscientização da doação de sangue.

Aos 24 anos, ela sofreu um acidente vascular cerebral (AVC) isquêmico — quando um coágulo bloqueia uma artéria, interrompendo o fluxo de sangue e oxigênio a uma parte do cérebro — e desde então faz transfusões regulares para prevenir novos episódios. “Cá estamos, há seis anos, com a transfusão salvando a minha vida, me dando energia, me permitindo ser capaz de realizar todas as outras coisas do meu dia a dia.”

Caroline também relembra um episódio marcante da infância. Aos sete anos, após contrair catapora, desenvolveu uma pneumonia dupla. Foi a primeira vez que precisou de transfusão. “Aquilo foi muito emblemático, tanto para mim quanto para a minha família. A gente teve que mobilizar parentes para doar sangue”, lembra.

A rotina hospitalar e os desafios diários

Apesar de toda a complexidade envolvida, Caroline aprendeu a encarar o tratamento com leveza e naturalidade. “Minha rotina hospitalar eu entendo como parte da minha vida. Isso vem muito de como a minha mãe colocou isso para mim. Ela fez com que eu entendesse que o hospital era parte da minha melhoria diária.”

Mas mesmo com a adaptação à rotina médica, a convivência com a falciforme carrega outros desafios, muitos deles invisíveis aos olhos dos outros. “Minha maior dificuldade hoje é fazer com que as pessoas entendam que o meu cansaço, a minha fadiga, não é preguiça. Que as dores, quando está frio, não são invenção.”

Esse é um ponto central para muitas pessoas com doenças invisíveis, que enfrentam não apenas os sintomas físicos, mas também o julgamento social. “Ter a compreensão do outro é o maior desafio atualmente.”

A assessora de marketing lida com a doença falciforme desde os primeiros dias de vida.
A assessora de marketing lida com a doença falciforme desde os primeiros dias de vida. – Reprodução/Instagram @_callmeca

A sorte de ter sangue de fácil compatibilidade

Em relação ao acesso ao sangue, Caroline se considera uma exceção afortunada. “Tenho muita sorte de ter um sangue de fácil compatibilidade. Por mais que os bancos de sangue às vezes estejam com baixa nos estoques, o hospital sempre faz campanha e eu também.”

Esse privilégio, no entanto, não é realidade para todos. Segundo dados do Ministério da Saúde, a anemia falciforme afeta de 25 mil a 50 mil brasileiros, sendo mais comum entre pessoas negras — estima-se que aproximadamente 8% da população negra no país tenha a doença.

A condição exige acompanhamento constante e, em muitos casos, transfusões regulares. Ainda assim, o número de doadores voluntários no Brasil está abaixo do ideal: apenas 1,6% da população doa sangue com regularidade, de acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), que recomenda pelo menos 2% para atender à demanda de forma segura.

Desinformação e invisibilidade

Apesar da relevância da doença falciforme no cenário nacional, o desconhecimento ainda é a regra. “A sociedade não compreende de forma nenhuma o que é a doença falciforme”, critica Caroline. Por isso, ela se dedica a informar as pessoas com quem convive, transformando cada contato em uma oportunidade de conscientização.

Ela cita um exemplo significativo: “Um personal trainer que tive quando era mais nova se interessou em aprender sobre a doença, adaptou os treinos e conversou com minha médica. Dez anos depois, ele encontrou outra pessoa com falciforme e lembrou de mim, já com um background. Isso mostra como a informação pode se espalhar.”

Caroline destaca ainda que a falciforme é uma das doenças mais comuns no Brasil, no entanto, ainda é pouco discutida e cercada por desinformação, o que contribui para o preconceito e a invisibilidade enfrentada por quem convive com a condição. “Não é porque a doença é invisível que a gente tem que ser também.”, diz a comunicadora.

A doação que gera energia

Para Caroline, a doação de sangue representa mais do que um gesto de solidariedade: é literalmente o que a mantém viva e funcional. “Costumo dizer para os meus amigos que o sangue é minha fonte de energia diária. Eles sabem quando minha transfusão está próxima, porque eu começo a perder energia, fico menos disposta.”

Ela acredita que, além de saberem que doar sangue é doar vida, as pessoas precisam entender que isso representa a capacidade de continuar vivendo com dignidade. “É de onde a gente tira força para fazer tudo no dia a dia.”

Se pudesse deixar uma mensagem para quem nunca fez uma doação de sangue, ela diz: “Mesmo que você não saiba quem vai receber, o seu sangue muda completamente a vida de uma pessoa. Você vai ser importante para o resto da nossa vida.”

Capacidade plena, mas com acolhimento

Caroline espera que a sociedade tenha mais empatia. Ela quer que as pessoas saibam que quem vive com doença falciforme é plenamente capaz — de estudar, trabalhar, amar e realizar sonhos — mas que há limitações reais, que exigem compreensão.

“Um dia a gente vai estar super bem, no outro talvez nem consiga sair da cama. Isso não é invenção, não é mentira. Todo mundo tem suas questões — as nossas são um pouquinho mais complicadas por serem diferentes.”

“Não é porque a doença é invisível que a gente tem que ser também”, diz Caroline.
“Não é porque a doença é invisível que a gente tem que ser também”, diz Caroline. – Reprodução/Instagram @_callmeca

Sintomas da doença falciforme

doença falciforme é uma condição genética que afeta os glóbulos vermelhos, fazendo com que eles assumam uma forma semelhante à de uma foice. Essa alteração compromete a capacidade do sangue de transportar oxigênio de maneira eficiente, o que gera diversos sintomas que impactam diretamente a qualidade de vida dos pacientes.

As manifestações mais comuns da doença incluem crises de dor intensa, chamadas crises vaso-oclusivas, que ocorrem quando os glóbulos deformados bloqueiam a circulação sanguínea em pequenos vasos. Essas dores podem durar horas ou dias, e geralmente acometem ossos, articulações, peito e abdômen.

Outros sintomas frequentes incluem fadiga crônica, icterícia (pele e olhos amarelados), infecções recorrentes, inchaço nas mãos e pés e atraso no crescimento. Além disso, a doença pode causar complicações graves ao longo do tempo, como acidentes vasculares cerebrais (AVCs), lesões nos rins, fígado e pulmões, além de úlceras nas pernas.

Em bebês, os primeiros sinais geralmente surgem entre os quatro e seis meses de idade, com episódios de febre, irritabilidade, inchaço nas extremidades e anemia. Por isso, o teste do pezinho é essencial para o diagnóstico precoce. Segundo o Ministério da Saúde, a triagem neonatal da doença falciforme é obrigatória em todo o Brasil desde 2001, e permite iniciar o acompanhamento clínico desde os primeiros meses de vida.

Tratamento

Não existe cura definitiva para a doença falciforme — com exceção do transplante de medula óssea, indicado apenas em casos muito específicos e com risco elevado. Por isso, o tratamento é voltado para o controle dos sintomas, a prevenção de complicações e a melhoria da qualidade de vida do paciente.

O plano terapêutico envolve uma série de medidas integradas. A base do tratamento inclui o uso de medicamentos como o sulfato de hidroxureia, que ajuda a reduzir a frequência e intensidade das crises de dor, além de antibióticos profiláticos, suplementação de ácido fólico e vacinas para prevenir infecções.

As transfusões de sangue são um dos pilares do tratamento, principalmente em casos de anemia grave, crises severas ou antes de cirurgias.

No entanto, o uso contínuo de transfusões pode levar a complicações, como a sobrecarga de ferro no organismo (hemossiderose), que exige tratamento com medicamentos quelantes para remover o excesso. Além disso, como o corpo pode desenvolver anticorpos contra o sangue recebido, a compatibilidade se torna mais difícil com o passar dos anos.

É de extrema importância o acompanhamento especializado por equipes multiprofissionais, incluindo hematologistas, clínicos, psicólogos e assistentes sociais. Também é fundamental o apoio de centros de referência, que garantem acesso aos medicamentos, exames e atendimento regular.

Segundo a diretriz do Ministério da Saúde, pessoas com doença falciforme devem ter um plano individualizado de cuidado, com consultas regulares, suporte psicossocial e orientação sobre hábitos de vida saudáveis. O acesso à informação e a uma rede de apoio eficiente pode fazer a diferença entre viver com dor constante e conseguir manter uma rotina mais digna e funcional.

Como doar sangue

Para doar sangue no Brasil, é necessário:

  • Ter entre 16 e 69 anos (menores de 18 precisam de autorização por escrito dos responsáveis);
  • Pesar mais de 50 kg;
  • Estar em boas condições de saúde no dia da doação;
  • Estar descansado, alimentado e apresentar documento oficial com foto.
  • Homens podem doar a cada dois meses (até 4 vezes por ano) e mulheres, a cada três meses (até 3 vezes por ano). O processo leva cerca de 40 minutos.

Os interessados podem procurar o hemocentro mais próximo consultando o site do Ministério da Saúde (gov.br/saude) ou diretamente no site da Hemorrede Nacional de Sangue, que reúne contatos e endereços dos principais bancos de sangue do país. Aplicativos de serviços públicos, como o Conecte SUS, também oferecem localizações de hemocentros com agendamento disponível em algumas cidades.



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