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O silêncio depois da tempestade

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O silêncio depois da tempestade



Este post contém spoilers do episódio desta semana de The Last of Us, que já está disponível na Max.

Entre sua enorme sequência de ação e o assassinato brutal de um dos dois protagonistas da série, o episódio anterior de The Last of Us, “Através do Vale”, foi tão impactante quanto uma hora de TV pode ser para um drama desse tipo. A morte de Joel, o momento em que acontece — tão cedo na temporada — e a maneira sádica como se dá, deixaram tanto jogadores quanto não jogadores comentando durante toda a semana — alguns, inclusive, questionando se ainda têm interesse em continuar assistindo à série agora que a relação entre Joel e Ellie não está mais no centro da história.

Antes de escrever este episódio, Craig Mazin certamente sabia que a morte de Joel seria divisiva, assim como foi quando aconteceu no segundo jogo. Assim, este episódio tinha duas grandes missões. A primeira: permitir que os espectadores respirassem após a intensidade de “Através do Vale”, enquanto Mazin e companhia estabelecem o próximo grande arco da série — Ellie e Dina se preparando para ir a Seattle buscar vingança contra Abby. A segunda: tentar provar que a série pode continuar sem Joel — que Ellie é uma protagonista forte mesmo sem seu pai adotivo, e que sua interação com esse elenco agora expandido compensa muito da perda causada pela saída de Pedro Pascal.

A primeira missão é cumprida com certeza. A segunda continua em aberto, embora haja sinais promissores na atuação de Bella Ramsey ao lado de Isabela Merced como Dina.

Depois do golpe duplo (ou incêndio, ou esfaqueamento) do ataque a Jackson e do assassinato de Joel, um episódio mais calmo e de transição permite que os personagens recobrem a compostura tanto quanto os espectadores. Voltamos às horas imediatamente após essas duas tragédias. Tommy limpa solenemente o corpo do irmão e tenta encontrar um pensamento positivo em meio àquela dor, dizendo: “Mande meu amor para Sarah.” Ellie acorda no hospital com um dreno torácico (*), ainda em choque com o que testemunhou — e é a última vez que vemos essas fases iniciais do luto.

(*) Palmas para quem assistiu The Pitt e imediatamente pensou em que procedimento a médica caçadora de cirurgias Trinity Santos estaria fazendo nesse mundo pós-apocalíptico.

Após a abertura, se passaram três meses. A cidade está intacta e o muro sendo reforçado. Ellie está fisicamente pronta para deixar o hospital, contanto que consiga passar por uma sessão de terapia com Gail. Ellie não quer estar ali, e Gail quer menos ainda — fica claro que ela só continua exercendo a profissão porque é a única pessoa viva com formação em psicologia na região. Na primeira temporada, vimos que Ellie tem uma enorme capacidade de superar os piores aspectos desse mundo e encontrar motivos para se alegrar. Mas seu comportamento com Gail — e com todos na cidade ao longo do episódio — não reflete isso. Apesar de tentar soar saudável e animada, é muito evidente que não está bem. Bella Ramsey é uma atriz excelente e aqui acerta o tom perfeito da atuação insegura que sua personagem apresenta: é apenas exagerado o suficiente para percebermos que ela está fingindo — e para que as pessoas de Jackson também notem —, mas não tão forçado a ponto de seus amigos e vizinhos sentirem necessidade de confrontá-la. A recuperação emocional de Ellie é uma mentira compartilhada pela cidade, porque todos amavam Joel (*) e se sentem protetores em relação à jovem que ele deixou para trás.

(*) Vemos que ainda existe um grande memorial para Joel, cheio de flores e bilhetes de agradecimento. Se as outras vítimas daquele dia receberam tratamento similar, não vemos, talvez porque eram figurantes sem importância para a história. Ou talvez porque Joel — cunhado da líder de Jackson e também uma figura de liderança nas patrulhas e na construção — fosse realmente uma pessoa muito importante, ao contrário de qualquer Joe Aleatório que foi esmagado pelo Bloater.

Após Ellie voltar para casa, Dina revela uma informação que vinha guardando há meses: Abby e seu grupo fazem parte de uma milícia baseada em Seattle, conhecida como WLF (Frente de Libertação de Washington). Dina está pronta e disposta a caçá-los junto com Ellie. Mas Tommy insiste que elas levem o plano ao conselho da cidade, prometendo apoiá-las se o fizerem.

Cortamos então para Seattle — não para reencontrar Abby, mas para conhecer um novo grupo: uma seita religiosa que usa roupas iguais e ostenta cicatrizes faciais combinando. Eles usam arcos e flechas em vez de armas de fogo e se comunicam por meio de assobios elaborados que um dos membros promete ensinar à sua filha pequena. Durante uma caminhada na floresta, o grupo é atacado, e o pai se refere aos inimigos como “Lobos” — ou seja, a WLF.

Colocar essa cena aqui é uma escolha interessante, ainda que não totalmente satisfatória. Ela traz um pouco de ação para um episódio que, de outra forma, é dominado por diálogos e belas paisagens. Também estabelece os Lobos como uma ameaça real, antes mesmo das cenas finais em que Dina e Ellie encontram seus corpos e percebem que os Lobos são muito maiores e mais organizados do que elas ingenuamente pensavam. No entanto, os cultistas — que também existem no jogo — evocam alguns dos elementos mais bobos e pretensiosos de The Walking Dead, e o ponto sobre o perigo que os Lobos representam poderia ter sido feito sem essa digressão. Também seria interessante mantermos a perspectiva de Ellie neste momento, mesmo que a série já tenha se desviado anteriormente para explicar por que Abby queria se vingar de Joel.

Na reunião do conselho da cidade, há um momento cômico em que um homem chamado Scott age como o Colin Robinson (o vampiro emocional de What We Do in the Shadows) do pós-apocalipse, falando sem parar sobre plantações, enquanto todos querem discutir a proposta de Ellie e Dina. Essa discussão não vai bem — principalmente porque os que são contra o plano estão obviamente certos. Em um mundo como este, buscar vingança contra Abby não tem valor algum: é um risco de recursos e de vidas, e ainda expõe Jackson a outros grupos que poderiam tentar tomar o que Maria e os demais construíram. Ellie tenta manter a calma e pintar sua missão como justiça, não vingança — mas nesse caso, as duas são intercambiáveis — e o conselho rejeita seu pedido. Também não ajuda que o maior apoiador da vingança seja Seth, o homofóbico boca-dura que criticou Ellie e Dina por se beijarem no baile de Ano Novo.

Antes da votação, Ellie promete respeitar a decisão do conselho — mas, claro, ela vai para Seattle de qualquer jeito. Logo, ela e Dina estão carregadas de provisões e armas (incluindo um rifle de precisão que Seth insiste que Ellie leve, em vez de sua arma inferior) e iniciam a jornada.

Alguém deveria estar surpreso? Só quem não conhece Ellie há cinco anos. No início do episódio, Gail — que é bem mais fria e misantrópica do que gostaríamos que uma terapeuta fosse — diz sem rodeios a Tommy: “Algumas pessoas simplesmente não podem ser salvas.” Esta é uma escolha incrivelmente estúpida e sem sentido da parte de Ellie. Quando Joel exterminou os Vagalumes, ele o fez com um objetivo produtivo: salvar a vida dela. Se Joel pudesse falar com Ellie ao visitar seu túmulo, ele a imploraria para voltar para casa e seguir com sua vida.

Mas muitos dramas envolvem personagens tomando decisões obviamente erradas assim que as fazem. E, a curto prazo, a jornada (*) aproxima ainda mais Ellie e Dina do que estavam em Jackson. Jesse não está por perto para distrair ou tentar Dina. Não há ninguém que faça Ellie se sentir autoconsciente, embora ela ainda tenha medo de interpretar mal os sinais que Dina continua enviando — “Eu nem estava tão bêbada”, diz Dina sobre o beijo delas — porque Ellie tem medo de se expor e ser rejeitada. Nada substituirá a química entre Ramsey e Pascal, mas Merced é uma parceira de cena interessante, e a luta interna de Ellie para manter sua guarda alta em torno de sua paixão dá a Bella Ramsey um bom material para interpretar, evitando que Ellie pareça obcecada exclusivamente por essa decisão imprudente.

(*) Durante a jornada, elas falam sobre música, e suas referências são artistas antigos como Frank Zappa. Isso faz sentido não apenas porque Ellie passou tanto tempo com o velho Joel, e porque vinis são mais fáceis de encontrar e tocar nesse mundo, mas também porque, no universo da série, o surto de Cordyceps aconteceu em 2003. Neste universo, não há Taylor Swift, nem Kendrick Lamar, e Beyoncé nunca teve uma carreira solo.

Se elas encontram infectados pelo caminho, não vemos. Mas a impressão é de que a jornada é pitoresca e tranquila. Isso parece correto, tanto como uma mudança de ritmo após a horda que atacou Jackson, quanto como um lembrete de que os infectados são apenas um elemento que coloca personagens como Ellie em um mundo caótico, sem leis e perigoso.

Foi uma má escolha de Ellie e Dina ir para Seattle. Resta saber se The Last of Us também está fazendo uma má escolha dramática.

+++LEIA MAIS: The Last of Us: Por que Ellie deixou grãos de café no túmulo de Joel

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