Celebridade
Sucesso no Forró, Guilherme Dantas revela maior desafio na carreira

“Acho que as pessoas ainda não entendem de fato sobre o que é ser um artista com deficiência visual”, diz Guilherme Dantas em entrevista exclusiva na CARAS Brasil
O cantor, compositor e sanfoneiro cearense Guilherme Dantas é um destaque do Forró na atualidade e tem muita história para contar e músicas para encantar. Ele nasceu com deficiência visual e se apaixonou pela música ainda na infância. O artista dedicou sua vida a desenvolver o seu dom e talento, que renderam prêmios e sucesso no cenário musical. Agora, ele tem novos projetos e objetivos bem claros: mostrar que nada é impossível para alguém com deficiência visual e conseguir disputar no mercado musical como qualquer outro artista para levar a sua arte para todos.
Em entrevista exclusiva na CARAS Brasil, o astro falou sobre os desafios da carreira para uma pessoa com deficiência visual, o maior sonho na profissão, a forma como adaptou seu palco para fazer shows e também contou sua história na música. Confira abaixo:
-Qual é o grande desafio em sua carreira hoje em dia?
Acho que as pessoas ainda não entendem de fato sobre o que é ser um artista com deficiência visual. Ultimamente, a gente decidiu passar isso com mais clareza para o público, mas sinto que ainda é algo que gera muitas dúvidas nas pessoas, então acredito que o meu desafio em primeiro lugar é mostrar que nada é impossível para mim.
-Qual é o seu maior sonho profissional?
Poder disputar mercado como qualquer outro artista, poder chegar em lugares que muitos já chegaram e que hoje, pela deficiência, algumas pessoas duvidam que eu possa chegar. Quero impactar muitas pessoas pelo mundo através da música e das minhas ações, e dizer cantando que, para Deus, e pra quem tem fé nada é impossível!
-Como a música entrou em sua vida?
Eu comecei a tocar muito cedo. Com 7 anos de idade, já sabia tocar um pouco de teclado e cantar. Me disseram que eu tinha ouvido absoluto, então continuei nessa jornada. Até que, com 12 pra 13 anos eu comecei a ganhar dinheiro na música, tocando em algumas bandas do bairro, em churrascarias, pequenos eventos, aniversários e etc… Desde então eu nunca pensei em ser outra coisa que não fosse músico.
-Como a deficiência visual te ajudou e te atrapalhou na carreira?
Acho que a deficiência me ajudou a ser diferente por si só. No momento que você tem algo que as outras pessoas não têm, existem dois lados da moeda. Muitos vão te olhar de maneira estranha, mas também outras pessoas podem ver de cara um diferencial. Acho que o momento que a deficiência atrapalhou não teve muito a ver comigo, mas sim com o olhar de quem estava me vendo. A deficiência até hoje gera muitas dúvidas nas pessoas de uma forma geral. O preconceito existe ainda hoje, é algo que eu tento quebrar, mas ainda não tem sido tão fácil.
-Como você se sente em ser um representante dos artistas com deficiência visual no Brasil?
Eu me sinto muito feliz, pois sei que estou abrindo caminho para muita gente boa que tem por aí e que ainda é desacreditada pelas pessoas e pelo mercado em geral. Ultimamente tenho recebido muito calor humano das pessoas, muitas palavras de carinho, porque não se trata só de ser um cantor com deficiência, mas alguém que mostra que a vida, apesar de não ser fácil, está aí pra ser vivida do jeito que a gente é, com o que a gente tem na mão, à disposição. E eu faço isso todos os dias e faço questão de mostrar. E acredito que é só questão de tempo pras pessoas entenderem que pra quem tem fé nada é impossível.
-Como você se descobriu como um deficiente visual? Você teve questionamentos ao longo da vida sobre sua condição?
Eu não lembro de que forma eu me descobri. Foi tudo muito natural. E, aliás, eu não me sinto cego. Eu sempre procurei fazer, desde criança, tudo que meus amigos faziam. O que dava pra eu brincar, eu brincava. Na escola, sempre fui muito ativo. Nunca deixei que as pessoas fizessem bullying ou olhassem pra mim com preconceito. Mesmo que isso acontecesse, eu fazia de conta que não era comigo.
-Você já foi vítima de preconceito na carreira? Como superou?
Quando eu tinha 18 anos eu gravei o meu primeiro CD de forró e fui bater na porta de um cara que no momento era uma das pessoas que mais fazia eventos na minha cidade. Ele ouviu, achou bacana, disse que eu cantava bem e tudo, mas depois ele falou o seguinte: “como você vai fazer um show se não enxerga? Como você vai interagir com a plateia? Você canta muito bem, mas acho que para fazer show não dá”. Essa é a história mais emblemática de preconceito que eu lembro mas, como já falei agora há pouco, eu nunca me deixei abater por preconceito de ninguém, porque até hoje em dia isso ainda existe.
-Quais adaptações você levou para o mundo da música para se sentir seguro como um cantor com deficiência visual nos palcos?
O nosso palco hoje é adaptado com piso tátil. Da parte traseira do palco até lá na frente, onde é o centro, tudo é marcado com o piso em relevo para que eu possa saber onde eu estou pisando. E também usamos fones de ouvido com uma pessoa passando todas as orientações para onde eu posso ir, se para a esquerda, se para a direita. Isso tem funcionado muito bem. São coisas simples, mas que têm feito muita diferença no meu show.
-O que a sanfona significa para você?
Eu sempre fui forrozeiro, sempre gostei de forró, ouvia as bandas no rádio e me imaginava tocando um dia nos palcos. Então, depois que eu toquei muito tempo teclado e piano, com 18 anos, decidi que eu iria aprender sanfona. E eu fiz isso sozinho. Usei a habilidade que eu já tinha no teclado para aprender o manejo da sanfona. A sanfona é minha vida. É o que me deu tudo que eu tenho hoje. Me deu as composições, me deu as oportunidades de cantar e fez com que muitas pessoas boas se aproximassem de mim.
-Como é o seu processo de composição das músicas? Tem algum tema que te agrada mais para cantar?
Bom, eu não tenho muita regra pra compor não. Faço de tudo um pouco. Na maioria das vezes, já vem a melodia e a letra prontas. E sobre temas, de fato eu gosto mais de compor coisas que falem de amor ou de sentimento em geral. Já fiz muita coisa diferente também, porque às vezes eu componho com outros parceiros. Mas 99% das vezes sempre foi nessa temática romântica.
-Qual música que você criou é a que mais te marcou até hoje? Por quê?
O nome da música é “Difícil de separar”. Foi uma música que eu fiz em 2016, quando eu conversava com uma moça que morava em uma cidade a 800 quilômetros daqui. A gente já se conhecia há algum tempo e tinha uma paixão muito forte entre nós. Mas, devido a muitas circunstâncias, a gente nunca conseguiu ficar juntos. Um dia eu estava tentando compor alguma coisa, passei mais ou menos uma hora só tocando instrumental na sanfona, quando me veio a letra dessa canção de forma, assim, muito rápida.
Então, para mim, ela é a minha música preferida, porque depois que lancei ela na minha voz, tive muita visibilidade como cantor naquele momento. Gravei um DVD no estado do Piauí, com o nome dessa música e, depois, outros cantores regravaram ela. Enfim, ela me traz muita felicidade.
-Você acaba de lançar o projeto Como Seria, que tem medleys em homenagem a música nordestina. Como foi a escolha do repertório?
Bom, foi fácil demais escolher o repertório do “Como Seria”, porque são músicas que fizeram parte da vida de todo nordestino que gosta de forró. A gente começou de forma muito despretensiosa, colocando algumas músicas diferentes no meu repertório. O forró tem algumas nuances dentro do ritmo, como o “forró romântico”. Então nós colocamos músicas de bandas mais românticas para serem tocadas num estilo mais dançante, que é o estilo que eu toco. Então, por isso que o nome é “Como Seria”, porque ele pega músicas que não foram tocadas de maneira diferente e coloca no meu estilo.
Sobre músicas especiais, eu acho que todas são, porque trazem muito a nossa essência. São músicas que muitos ouviam quando eram crianças ou adolescentes e que fazem parte da nossa memória. E não teve nenhuma tão difícil de cantar não. Pelo contrário, gravei todas com muita alegria e facilidade.
-Quando não está nos palcos, o que você faz no dia a dia?
Ah, eu adoro estar junto das pessoas que eu amo, família, amigos, gosto de fazer coisas simples, conversar, ir para lugares onde sou bem recebido, mas muitas vezes também gosto de ficar no quarto, assistindo, sou muito fã de tecnologia, nerd ou geek, como chamam, né? Risos.
-Você tem o desejo de construir uma família?
Sim, quero muito ser pai de pelo menos dois filhos. Quero construir uma família próspera e que seja meu porto seguro até o fim da vida. No momento eu estou conhecendo uma pessoa que já tá fazendo parte dos meus melhores momentos.
-Quais são os seus ídolos na carreira? Você já encontrou algum deles? Como foi?
Eu não sei se tenho ídolos, mas tenho muitos artistas que admiro. Quando eu era criança, cresci ouvindo Mastruz com Leite. Depois que fiquei adulto e comecei a tocar sanfona, acompanhei vários cantores que cantaram no Mastruz. Isso para mim foi muito interessante! Mas se for falar de mais alguém, sou fã de Luiz Gonzaga, pela sua genialidade, Dominguinhos, pela pureza do seu som. Mas também tem cantores de outros estilos que eu gosto, tipo Roberto Carlos, que é um ícone da nossa música brasileira, Stevie Wonder, Ray Charles, referências mundiais que superaram todos os desafios, tanto pela deficiência quanto pela sua cor. Enfim, são muitos que eu me espelho e admiro.