Música
Um Completo Desconhecido brilha nas atuações, mas peca no ritmo da história

“As pessoas inventam o seu passado, Sylvie! Eles se lembram do que querem. Eles esquecem o resto“, exclama Bob Dylan, interpretado por Timothée Chalamet, em uma das cenas da cinebiografia Um Completo Desconhecido. Essa frase condiz bastante com o personagem principal, um dos cantores e compositores mais influentes da música, conhecido por contar diferentes versões de momentos da própria vida. Mesmo com toda essa dualidade, o filme consegue trazer uma ótima abordagem para o artista, com atuações e ambientações fantásticas, mas peca no ritmo da história.
Inclusive, esse lado misterioso e incoerente de Dylan é algo abordado por Sylvie Russo (Elle Fanning), que o coloca contra a parede para saber mais sobre a vida do então namorado, porém, não consegue descobrir detalhes.
Por exemplo, o astro da música disse à imprensa em 1961 que veio de Gallup, Novo México, e se juntou a uma espécie de circo itinerante aos 13 anos, no qual trabalhou como “garoto de limpeza” e operador de roda gigante.
Jornalistas, escritores e biógrafos como Anthony Scaduto, Clinton Heylin, Robert Shelton, David Hajdu e Howard Sounes trabalharam por diversos anos para separar fatos de ficção da vida de Bob Dylan ao longo das décadas. No entanto, sempre existiram incoerências, como no livro Chronicles: Volume One, repleto de afirmações questionáveis (no mínimo). Volto a parafrasear: “As pessoas inventam o seu passado, Sylvie! Eles se lembram do que querem. Eles esquecem o resto“.
Com direção de James Mangold (Johnny & June, Logan, Ford vs Ferrari) e roteiro coescrito por Jay Cocks, Um Completo Desconhecido é vagamente baseado em Dylan Goes Electric! Newport, Seeger, Dylan, and the Night That Split the Sixties (2015), obra de Elijah Wald. O filme chega aos cinemas brasileiros no próximo 27 de fevereiro.
Agora, a crítica de Um Completo Desconhecido
Com cenários e figurinos que retrata muito bem a Nova York do começo dos anos 1960, quando o então desconhecido e misterioso Robert Allen Zimmerman (introduzido nas primeiras apresentações como Bobby Dylan) desbravava a metrópole cinzenta. Curioso, ele tenta conhecer Woody Guthrie (Scoot McNairy), um dos grandes nomes da folk music e um dos heróis de Dylan.
Internado após ser diagnosticado com a doença de Huntington, Guthrie recebia uma visita de Pete Seeger (Edward Norton), outra lenda do folk, quando o jovem Bob Dylan entrou no quarto de hospital e apresentou uma das composições, feita em homenagem a Woody Guthrie, que mais tarde se tornaria “Song to Woody“. Ambos ficaram impressionados com o talento, e Seeger se torna uma espécie de mentor e padrinho do protagonista.
O começo da narrativa tem um ótimo ritmo e consegue introduzir os personagens de maneira apropriada. Na Igreja, Bob Dylan conhece Sylvie e os dois começam a engatar um relacionamento. Porém, com diversos outros assuntos, o namoro dos dois não tem muito tempo para ser explorado. Em um momento, eles começam, do nada, estão morando juntos e, de repente, começam a ter crises com a fama do cantor.
Apesar das 2h 20m de duração, o filme se apressa em diversos aspectos, especialmente para desenvolver a fama de Dylan e os problemas que começa a ter. Em certo momento, ele assina com uma gravadora e já grava o primeiro disco, que não vai tão bem quanto o esperado. Então, ele começa a ter ideias que se tornariam músicas do clássico The Freewheelin’ Bob Dylan (1963) – e, do nada, já é reconhecido nacionalmente e começa a ter legiões de fãs.
Ou seja, com essa duração mais extensa, o roteiro poderia focar em determinados aspectos para conseguir dar ao espectador uma noção de passagem do tempo. No entanto, este problema é recompensado com as ótimas atuações, desde o elenco principal até os coadjuvantes.
Um dos grandes destaques é Monica Barbaro, intérprete do ícone do folk Joan Baez, cuja introdução na trama arrepia. Ela tem grande presença no decorrer da narrativa e sempre mostra ao que veio. Inclusive, a personagem tem esse destaque na cena do folk dos Estados Unidos e também se envolve em um relacionamento com Bob Dylan, que mais tarde seria retratado na música “Diamonds and Rust“.
Outras duas grandes atuações são justamente de Scoot McNairy e Edward Norton. O primeiro aparece apenas no ambiente do hospital com fala e movimentos limitados, enquanto o segundo tem uma presença maior, seja na administração da carreira de Dylan ou na organização do Newport Folk Festival, que contou com momentos memoráveis e marcantes protagonizados por Bob Dylan.
Um Completo Desconhecido usa de certas fórmulas das cinebiografias de Hollywood, mas conta uma história convincente, com cantorias que não ficam forçadas, e atuações de alto nível. As oito indicações no Oscar 2025 são mais do que justas.
“Breathtaking cinema at the highest level and one of the best films of the year.” A COMPLETE UNKNOWN. A film by James Mangold, starring Timothée Chalamet as Bob Dylan. Only in theaters Christmas Day. Get tickets now. #ACompleteUnknownhttps://t.co/4k6WcfAq9Ypic.twitter.com/xyJhWfXzt8
— Searchlight Pictures (@searchlightpics) December 23, 2024
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