Celebridade
movimento mostra lado ridículo em “Eu sou racista?”
Passadas as eleições presidenciais americanas há uma semana (5), viralizam nas redes sociais compilações de progressistas descontentes com a vitória de Donald Trump. Em vídeos curtos gravados no carro ou em casa, eles gritam, choram, se descabelam e prometem romper laços com os responsáveis.
Quem assiste ao documentário cômico “Am I racist?” (“Eu sou racista?”, em tradução livre, disponível no Brasil pelo site de streaming Daily Wire +, sem tradução), filmado antes da campanha e apresentado pelo comentarista conservador Matt Walsh, percebe que o comportamento não é novo.
Em um curso ministrado por uma ativista antirracista, Breeshia Wade — que se diz uma “capelã zen-budista” especializada em “usar o luto como ferramenta para a transformação social” —, os outros participantes chamam a polícia quando descobrem que “Stephen”, um sujeito questionador e um pouco inconveniente, que pediu licença para ir à sala do choro para derramar lágrimas pelo racismo, na verdade é Walsh, famosa personalidade conservadora do YouTube.
Não só os outros participantes, com anuência de Wade, pensam que o incidente é caso de polícia, como fingem que a mera presença de Walsh é algum tipo de ameaça à integridade física da palestrante. Detalhe: o comentarista tinha pagado 30 mil dólares (R$ 173 mil na cotação atual) para participar.
Coque samurai e calça apertada
“Está dizendo que preciso de um disfarce melhor?”, perguntou Walsh à palestrante zen-budista, que começou o curso com uma meditação e pediu a todos os alunos que declarassem “seus” pronomes.
A pergunta foi o mote do documentário para colocar uma peruca com coque samurai, óculos de bibliotecária e uma calça apertada em Walsh, à guisa de simular a aparência de um homem progressista.
O disfarce de Walsh é inspirado em um dos intelectuais que ele entrevistou no documentário “O que é uma mulher?” (2022), no caso um acadêmico incapaz de responder à pergunta. Agora com indumentária apropriada, Walsh então parte para uma jornada de “aprendizado” que o leva a tirar um certificado de especialista em “diversidade, equidade e inclusão” (DEI).
O curso de DEI cumprido pelo apresentador foi ministrado por Regan Byrd, uma autointitulada “ativista, palestrante e treinadora antiopressão premiada” que já “treinou dezenas de organizações em antiopressão”, incluindo o Partido Democrata do Colorado e o Google. Quando Walsh pressiona Byrd a respeito das palavras de Martin Luther King Jr., para quem o que importa é o conteúdo do caráter e não a cor da pele, ela responde que “King disse muitas coisas”. Segundo a treinadora, não podemos ignorar a cor das pessoas agora “porque ainda estamos trabalhando no problema” do racismo.
Povo simples e não racista vs. “especialistas” que detestam o próprio país
Munido de seu certificado de especialista, Walsh partiu para a evangelização do antirracismo. Há três momentos interessantes dessa empreitada: quando ele conversa pessoas comuns brancas e negras, quando entrevista a autora antirracista bestseller Robin DiAngelo, e quando lança seu próprio workshop antirracista.
As entrevistas com cidadãos comuns deixam o espectador respirar aliviado: o senso comum americano ainda é realmente contra o racismo, de forma clara, simples e correta, ao contrário dos intelectuais entrevistados portando seus títulos de PhD.
“Nasci em 1960. Meu pai, tio e avô eram membros da Ku Klux Klan”, disse um homem branco simples, a quem faltam alguns dentes e que portava uma camisa com a estampa “Vaginatariano”. “Nunca me afetaram. Aceito as pessoas como são”, afirmou ele, entrevistado na porta de um bar.
“Temos que amar uns aos outros, é assim que vencemos o racismo”, disse um homem negro do “Sul profundo” dos Estados Unidos, possivelmente com idade suficiente para ter vivido sob as leis de segregação racial, conhecidas como leis Jim Crow. Ele se recusou a ler os intelectuais que Walsh citou. “A única coisa que leio é a Bíblia”, disse.
Os absurdos ditos por intelectuais e ativistas antirracistas entrevistados, que estão entre os mais influentes do país, são muitos. “Os Estados Unidos são racistas até o osso”, diz Kate Slater, PhD, que sorri satisfeita quando Walsh acusa a si mesmo de racismo. Ela não resolve o dilema posto pelo entrevistador: que fazer com sua filha pequena que prefere a Moana às princesas brancas da Disney, o que é “louvável”, mas quer se fantasiar de Moana no Halloween, o que é “apropriação cultural”? Slater diz que já conversa sobre raça e racismo com sua filha de quatro anos. Para ela, é bom entrar no assunto “antes mesmo de a criança aprender a falar”.
Uma “pessoa diversa” é “uma pessoa que não é branca”, informa uma bibliotecária que ajuda Walsh a escolher obras antirracistas. É quase um ato falho que revela o que “diversidade” realmente quer dizer no ativismo identitário, e não é o significado do dicionário. A cultura das pessoas brancas consiste em “comprar e roubar coisas”, explica a ativista Sarra Tekola, que cobrou US$1,5 mil (R$ 8,67 mil) pela entrevista.
Mas a declaração que leva o ouro é a de Saira Rao, ativista que junto com sua sócia Regina Jackson realiza jantares exclusivos para mulheres brancas em que as trata mal e pede que saiam se forem chorar. “Este país”, afirmou Rao, “é um entulho em chamas racista, transfóbico, homofóbico, xenofóbico, capacitista, classista, islamofóbico e misógino”, afirmou Rao.
Walsh, impedido de participar de um desses jantares (que custam US$ 5 mil por pessoa, quase R$ 29 mil) por ser homem, participa como um garçom entusiasta, estabanado, que entre deixar pratos caírem e oferecer pãezinhos demais para Rao se gaba de seu certificado de DEI e declara como são importantes as coisas ditas pelas anfitriãs radicais.
“Meu marido é negro”, disse uma das mulheres brancas que pagaram pela humilhação, “e eu faço ‘shh’ para ele quando ele é barulhento em locais públicos. Deve ser minha supremacia branca falando”. “Republicanos são nazistas”, afirmou Rao. “O sistema inteiro tem que torrar. Este país é um pedaço de m***a”.
Em 1993, o filósofo conservador britânico Roger Scruton publicou um artigo em que cunhou o termo “oicofobia” para um comportamento comum na esquerda. Consiste em uma aversão pelo próprio lar cultural, um “estereótipo negativo da cultura majoritária”. “Mal existe algum insulto no dicionário que não seja lançado contra a sociedade americana” pelos oicofóbicos, escreveu o filósofo. Rao não só confirma isso, como é prova viva de que a extrema esquerda chega a criar xingamentos novos que nem estavam no dicionário.
O documentário também mostra denúncias falsas de racismo. A maior delas, um ataque racista violento completamente forjado pelo ator Jussie Smollett em 2019, para promover sua carreira, Walsh faz questão de reencenar.
O momento mais engraçado do documentário é o workshop de Walsh. Seguindo o conselho da Dra. Slater de confrontar seu tio supostamente racista, seu “tio Frank”, um idoso em cadeira de rodas que fica em silêncio, é posto na frente da turma de interessados em aprenderem a serem mais antirracistas. Walsh dá uma bronca no tio Frank por uma piada de 20 anos atrás: “qual é a diferença entre uma mesa de picnic e um pai mexicano? A mesa de picnic consegue alimentar uma família de cinco pessoas”.
O treinador convida os alunos para ajudarem a descascar o tio Frank. Duas alunas, pedindo licença ao sobrinho, dizem ao tio “vá se f***r”. Uma delas confessa que cortou relações com “todo mundo” em sua família, incluindo os pais, por suposto racismo. O tiozão do churrasco nunca foi tão malhado.
Onde o documentário poderia ter sido melhor
O documentário é o retrato de um momento que possivelmente está passando, o ápice do woke (identitarismo) desde a morte de George Floyd, em 2020, que, na esteira de outras mortes trágicas similares cuidadosamente selecionadas pelos ativistas nos anos anteriores, foi o estopim para uma crise racial com protestos violentos pelo país, custando mais vidas e bilhões de dólares.
“Eu sou racista?” é bom, mas é inferior a “O que é uma mulher?”. O principal pecado do documentário mais recente foi apostar demais na capacidade de interpretação de Walsh, que não é um ator, em uma tentativa de fazer uma espécie de Borat de direita.
Enquanto o humor mordaz de Walsh brilha com sua própria persona em “O que é uma mulher?”, agora o espectador se pergunta se não tem razão a autora antirracista Robin DiAngelo, quando ela resiste temporariamente a dar dinheiro de reparação histórica para o produtor negro de Walsh, Benyam Capel, dizendo que isso é esquisito. Ela acaba cedendo, tirando 30 dólares da bolsa — mas há uma perda de oportunidade de dar corda para ela própria se enfocar, como acontece com outros supostos especialistas no documentário anterior. A reparação histórica foi esmola: DiAngelo cobrou US$ 15 mil (R$ 86,7 mil) pela entrevista.
O mesmo pode ser dito sobre as cenas no jantar de Rao: a atuação de Walsh não é muito engraçada, e acaba sendo uma distração frente aos absurdos que saem da boca das anfitriãs.
DiAngelo vendeu milhões de livros após a morte de Floyd e enriqueceu com sua oicofobia profissional travestida de treinamento corporativo. Em agosto deste ano, mesmo mês em que Matt Walsh apareceu na Convenção do Partido Democrata com sua peruca de coque samurai para promover o documentário, o jornal The Washington Free Beacon publicou uma devassa que expôs plágio cometido por DiAngelo em sua tese de doutorado, de 2004. A autora respondeu que era uma tentativa de desqualificação “transparentemente partidária”, mas terminou em desgraça na opinião pública. Pode não ser o fim do identitarismo, mas é o fim de uma era.
Como assistir ao documentário: mediante o pagamento de uma mensalidade de US$ 15 (R$ 86,50, sem o IOF), é possível assistir em inglês na Daily Wire através deste link.