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Estudo mostra conexão entre crimes econômicos e ambientais na produção de madeira, ouro e gado na Amazônia

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Estudo mostra conexão entre crimes econômicos e ambientais na produção de madeira, ouro e gado na Amazônia

Instituto Igarapé analisou dados de 131 operações da PF realizadas entre 2016 e 2022. ‘Ações repressivas não bastam’, diz pesquisadora. Extração ilegal de madeira e grilagem são principais causas do desmatamento na Amazônia, diz ONG
Um estudo que analisou 131 operações da Polícia Federal na Amazônia, deflagradas de 2016 a 2022 para combater crimes ambientais, aponta de que forma os ilícitos econômicos, como a lavagem de dinheiro, dão suporte à derrubada da floresta e tornam lucrativas as cadeias de produção ilegal de madeira, ouro e gado — as três que mais geram danos ao ambiente.
O estudo foi realizado pelo Instituto Igarapé, entidade que produz dados sobre temas relevantes para a elaboração de políticas públicas.
“O crime ambiental hoje é operado por organizações criminosas. Ainda há uma ideia de que é uma atividade de subsistência, mas o que a gente vem mostrando é que é uma atividade altamente lucrativa, feita por organizações criminosas em sentido lato — com hierarquia, divisão de tarefas e grandes investimentos para montar as operações”, diz Melina Risso, diretora de pesquisa do Instituto Igarapé.
A entidade criou uma nova tipologia, de “ilícitos econômicos”, para compreender as práticas que possibilitam o lucro nas cadeias de produção ilegais. Os ilícitos econômicos incluem:
lavagem de dinheiro: refere-se ao ato de dissimular ou ocultar a origem do recurso obtido ilegalmente;
esquentamento (ou lavagem) dos ativos ambientais: ocorre ao se declarar que um ativo, como o ouro, foi extraído de um local regularizado, quando na verdade ele é proveniente de uma área de exploração proibida, como unidades de conservação e terras indígenas;
fraude: consiste em atos praticados para mascarar ilegalidades. Pode ter natureza documental, processual ou fiscal;
corrupção e prevaricação: são as ilegalidades feitas com participação de agentes públicos, que recebem em troca alguma vantagem.
O Igarapé identificou que esses quatro tipos de ilícitos econômicos, sozinhos ou combinados, estiveram presentes em todas as 131 investigações da PF analisadas no estudo. Veja no gráfico abaixo:
Os dados das investigações foram obtidos pelo instituto por meio da Lei de Acesso à Informação e por divulgações feitas pela própria PF.
Cadeia de produção da madeira
Ao analisar 44 operações da PF com foco no combate à extração ilegal de madeira, o estudo identificou padrões que indicam como esses crimes correlatos sustentam o crime ambiental, em todas as fases da cadeia produtiva.
Veja exemplos abaixo:
1. Extração:
Aprovação facilitada de planos de manejo florestal mediante pagamentos, resultando na emissão de licenças ambientais em desconformidade com a lei — corrupção;
Título de propriedade fraudulento ou registrado em nome de “laranjas” na área da exploração madeireira — fraude documental.
2. Transporte:
Transporte realizado com licenças que não correspondem à realidade quanto às espécies extraídas, volume e/ou origem — fraude documental, corrupção e esquentamento do ativo;
“Vista grossa” dos fiscais diante de irregularidades encontradas durante a fiscalização da mercadoria — corrupção.
3. Serrarias e madeireiras:
Emissão de notas fiscais “frias” ou com descrição de espécies vegetais divergentes dos documentos de controle ambiental — fraude documental, fraude fiscal e esquentamento do ativo;
Pagamento de propina a servidores públicos para autorizar o funcionamento de madeireiras embargadas pelo Ibama — corrupção.
4. Comércio Nacional:
Dissimulação dos lucros obtidos ilegalmente por empresas do ramo — fraude documental e lavagem de dinheiro;
Movimentação de recursos incompatível com a capacidade financeira das empresas — fraude documental e fiscal, lavagem de dinheiro e corrupção.
5. Comércio internacional:
Exportação clandestina (sem documentação) — fraude documental e fiscal;
Exportação com documentos vencidos ou falsos — fraude documental e fiscal e esquentamento do ativo.
Operação Carranca investiga exploração ilegal de madeira no Pará
Um dos exemplos de esquema complexo, citado no estudo, foi o descoberto pela Operação Carranca, deflagrada pela PF no Pará, em 2020 (veja no vídeo acima). As investigações apontaram que os criminosos operavam em quatro núcleos distintos:
Madeireiros de menor poder econômico, responsáveis pela linha de frente da extração ilegal de madeira nos municípios;
Madeireiros de grande poder econômico, financiadores de extensas cadeias de extração, serragem e distribuição de madeira ilegal, envolvendo manipulação de créditos florestais e falsificação de documentos;
Pessoas ligadas a órgãos públicos, como as Secretarias Municipais de Meio Ambiente, advogados e engenheiros florestais, que utilizam sua função pública para favorecer e acobertar crimes ambientais;
Policiais responsáveis pela fiscalização na rodovia Transamazônica, que exigiam vantagens indevidas dos caminhoneiros como condição para permitir a passagem ou forneciam informações sigilosas sobre operações de fiscalização na estrada.
Recomendações
As cadeias de produção ilegal de ouro e gado apresentam esquemas criminosos muito semelhantes aos da madeira, segundo o estudo, com ilícitos econômicos dando suporte aos crimes ambientais.
“Precisamos de capacidade institucional para fazer o enfrentamento com o mesmo grau de sofisticação”, afirma Melina Risso.
Ela sugere um alinhamento cada vez maior entre agentes do Ibama, da Receita, do Banco Central e do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), órgão responsável por identificar indícios de lavagem de dinheiro, para que haja um combate mais efetivo do desmatamento.
Segundo a pesquisadora, somente ações repressivas, como as operações da PF, não bastam. É preciso atacar os crimes financeiros que acompanham o crime ambiental para alcançar o objetivo de preservar a Amazônia.
Nesse sentido, o estudo faz uma série de recomendações, como elaborar “uma avaliação de riscos específica para lavagem de dinheiro e corrupção relacionada a crimes ambientais na Bacia Amazônica” e “ampliar a difusão e o conhecimento sobre a interconexão entre crimes ambientais e ilícitos econômicos, promovendo estudos específicos e pesquisas nas instituições de controle”.

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